terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Veranda encantada.

Larissa e professora.

Para quem ainda não leu ou quer ler de novo, abaixo o texto da Larissa.

A VARANDA ENCANTADA QUE VIU O TEMPO PASSAR

Em tudo existe uma razão de ser, uma história a ser contada, uma história da própria história e a minha cidade, Campo do Tenente, também tem as suas. Na busca de conhecê-las eu saí disposta a encontrá-las de qualquer forma. E foi na casa 307, em frente à rodovia estadual que corta a cidade- PR 427, sentado na varanda no alto dos seus setenta e oito anos que conheci o senhor João Geraldo Comitti, conhecido também por seu "Galgui", homem culto apesar do pouco estudo e com muito, muito conhecimento para transmitir. Sentei-me no murinho da varanda e no decorrer da conversa como num encantamento entrei o túnel do tempo, em uma viagem inesquecível pela história.
"Relembrar o passado é reviver tudoo que já se foi, porém agora como espectador da própria história. Mudá-lo? Impossível! Mas enxergá-lo de maneira diferente é o que nos faz percorrer a memória e deixá-la solta feito um passarinho que fugiu do cativeiro e agora pode voar.
Tudo aqui é muito diferente do tempo que eu era apenas um menino, em uma cidadezinha pequena com poucas casas e muita mata principalmente a araucária- árvore nativa da região.
A cidade começou a progredir com a instalação da ferrovia,eram três linhas. A principal era a de passageiros que passava em frente à estação, a de manobra e a outra era a de carga, ao redor da estrada de ferro era cheio de lenha , pilhas e pilhas para a locomóvel- locomotiva movida a vapor, por que naquela época não é como hoje máquinas elétricas então precisava de muita lenha para fazê-la funcionar. E como era bom ouvir o apito do trem. Saíamos correndo para a estação, assim podíamos ver os viajantes que iam e vinham da capital. E a fumaça deixava para trás um rastro de saudade.
Com a estrada de ferro veio também a industrialização da madeira, todo esse espaço era ocupado pela enorme serraria do senhor Henrique Stalke, homem de visão, um empreendedor como se diz hoje. Ele proporcionou um grande desenvolvimento para a cidade, os trabalhadores podiam morar nas casas da fábrica, trouxe a energia elétrica, o telefone, coisas que cidades maiores ainda não possuíam, mas com o tempo a grande fábrica faliu, hoje restam apenas galpões e montanhas de serragem. Imagina só, até hoje tem serragem daquela época e os meninos brincam nos montes exatamente como fazíamos antigamente, escorregando com pranchas de madeira lá do alto até o pé da montanha, nossa chega a dar um friozinho na barriga só de lembrar.
Outra brincadeira que adorávamos era brincar de pega-pega em cima das pilhas de madeiras que ficavam expostas para secar. Que perigo! Mas para nós meninos imortais, tudo era possível, e aquelas madeiras que na fábrica se transformavam em simples caixas para nós eram nuvens, um verdadeiro sonho de liberdade, corríamos, saltávamos sobre ela uma a uma, muitas vezes de braços abertos, com o vento batendo no rosto, era como se estivéssemos voando como pássaros ou como belas pipas coloridas plainando no ar. As bolinhas de gude saltitando no bolso davam a impressão que era nosso coração batendo pelo corpo todo, ficávamos ali horas, até quando alguém tinha a idéia de jogar malha- jogo com a coleção de figurinhas chamadas de Zequinha.
Um pouco antes de 1960 os trilhos da estrada de ferro foram transferida para outro trajeto, a estação ferroviária fechou, a fábrica já não funcionava , então muita gente foi embora daqui a procura de uma vida melhor.
Eu fiquei, e estou aqui até hoje, não foi fácil chegar onde estou, mas pretendo por muito tempo olhar da minha varanda o movimento da estrada, de onde vi o tempo passar, antes eu esperava os trens, observava as carroças e hoje vejo os enormes caminhões"
E foi assim, no indo e vindo do passado ao presente que me encantei com as lembranças do seu "Gaugui", lembranças do lugar onde vivo e que hoje fazem parte de mim.